Relatório do Webinário “Próximos passos do open banking no Brasil com João Pereira e Carlos Ragazzo”

Introdução

O Laboratório de Políticas Públicas e Internet (LAPIN), em parceria com o Insitituto ProPague, promoveu o webinário “Próximos passos do open banking no Brasil com João André Pereira e Carlos Ragazzo“, apresentado por Gabriel Araújo Souto e Luiza Leite. A discussão buscou identificar os próximos passos de implementação do open banking no Brasil e seus impactos em âmbito concorrencial, além de tirar as dúvidas que surgiram sobre o assunto.

O presente relatório visa a sintetizar os principais pontos arguidos pelos participantes convidados ao debate do dia 21/05/2020. A transmissão completa do webinário, bem como as falas na íntegra dos convidados, podem ser assistidas clicando aqui. A equipe do LAPIN deseja uma ótima leitura!

Exposição dos convidados e Q&A

Carlos Ragazzo, professor da FGV Direito Rio e ex-Superintendente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), iniciou sua apresentação ressaltando que é preciso entender quais são os aspectos do Sistema Financeiro Nacional (SFN) que estão gerando o ambiente fértil para o surgimento do open banking, uma vez que todo o processo de digitalização que a população brasileira está vivendo influencia o uso do SFN, inclusive com fintechs que já fazem parte do cotidiano do brasileiro.

Para isso, o professor relembrou o caso VISA/VISANet do CADE, que teve seu surgimento por influência de um estudo do Banco Central do Brasil (BCB) junto ao Ministério da Fazenda, em que se via um cenário concentrado de poder de mercado no Sistema Brasileiro de Pagamentos. No entanto, hoje tem-se um cenário bem distinto com um número grande de players através da quebra de exclusividade entre a bandeira e a credenciadora de cartões.

Ragazzo enfatizou a evolução normativa brasileira acerca da interoperabilidade e estandardização de soluções de pagamentos, que permitiu a integração entre agentes de cadeias de pagamento, fazendo que as maquininhas conseguissem aceitar todas as bandeiras, garantindo a viabilidade técnica na diversificação desse mercado. Sendo assim, ele explica que a regulação não pode ser encarada como uma barreira à entrada ou um óbice para as empresas, e sim como uma infraestrutura que viabiliza a competição no mercado, ou seja, uma ideia de regular para aumentar competição.

Nesse mesmo sentido, as Resoluções do BCB que viabilizaram o internet banking, com acesso isento de tarifas, bem como da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) com o cadastro digital, são exemplos de regulações que promoveram o surgimento de novos modelos de negócio e que hoje em dia há um cenário completamente diferente de volume de investimentos indo para essas novas plataformas. Ele pensa que que talvez num primeiro momento vindo dos bancos tradicionais, mas agora talvez até direto. Através dessas regulações, teve-se também a ideia de combater o problema relacionado à escassez de fontes alternativas de acesso ao capital e a dificuldade de você ter novos players o oferecendo. Assim, tornou-se fundamental o papel do Cadastro Positivo através das informações cadastrais do cliente para entender qual é o seu risco de inadimplência.

Pergunta: Como que o senhor vê a competitividade do open banking sendo fundamental para o crescimento da economia durante a pandemia?

Carlos Ragazzo acredita que está havendo uma bancarização talvez nunca vista no Brasil. Assim, quem tem as informações do consumidor vai conseguir enxergar qual é o seu perfil e isso vai resultar na apresentação de novas possibilidades de crédito. O professor ressalta que nesse momento há milhares de possibilidades de influência do open banking, já que muda o cenário de competição, tirando a informação de um lugar que está fechado e viabilizando uma oferta maior de crédito.

Pergunta: Como o futuro do open banking pode ser pensado com as big techs atuando no setor financeiro?

Ragazzo explicou que tal pergunta é um exercício de futurologia. A questão é descobrir quem vai ser a grande empresa de crédito que vai conseguir aproveitar melhor essa onda e a surfar melhor. As instituições financeiras mais tradicionais já tem porte, tecnologia e já trabalham com o público que já está associado a serviços financeiros, então ele acha que esse ataque ao mercado de crédito serve para trazer mais competição através dessas grandes corporações.

João André Pereira iniciou sua exposição ressaltando que há uma jornada histórica percorrida desde a deficiência de competição até a abertura do sistema financeiro, através da interoperabilidade de uma forma mais ampla. Pereira explicou que o relatório de vigilância do BCB citado por Ragazzo trouxe questões de verticalização do sistema de pagamentos importantes para propiciar a inovação e a digitalização da população brasileira. Desde a portabilidade de salário, que é algo que produz um fluxo de recursos, até a portabilidade de crédito, que sistematizou várias aberturas de conta digital, bem como duplicata eletrônica, melhoraram o ambiente do SFN através das regulações propostas ao longo do tempo.

Pereira explica que o open banking é um projeto de extrema prioridade no BCB e que não parou durante a pandemia. Continua a análise da consulta pública e há um grupo de trabalho também tratando com o mercado para gerir a auto-regulação do modelo. Ele afirmou que o mais importante é a implementação e a operacionalização do modelo, dependendo em grande parte do próprio mercado.

João acredita que o estado-da-arte do open banking a ser seguido é o do Reino Unido, que implementou a Diretiva Europeia de Pagamentos, de forma padronizada e estruturada, sendo um exemplo para o Brasil. Ele opina que o grande diferencial do Reino Unido é, sem dúvida, a padronização. O que se observou no modelo inglês é que no primeiro momento houve uma dificuldade de se criar a padronização sem uma segurança e sem afetar a jornada do cliente, o que deve ser acompanhado de perto pelo BCB.

Quanto à implementação do modelo no Brasil, ou seja, a parte mais burocrática da regulação, o escopo de participantes composto pelas instituições reguladas pelo BCB do segmento s1 e s2 já deverão providenciar o acesso à informação, garantindo o consentimento do cliente. O processo de implementação está segregado em fases. Há fases que foram trazidas exatamente em função da sensibilidade da informação que está sendo tratada. A primeira fase se trata de dados já abertos e públicos das entidades financeiras, o que já permite um primeiro teste das Application Programming Interfaces (APIs).

Na segunda etapa, até maio de 2021, trata os dados cadastrais e transacionais, ou seja, os dados que são sensíveis, sendo necessário necessário consentimento para processo de autenticação. Já a terceira fase aumenta um pouco a sensibilidade ao programa. Ela está prevista para agosto de 2021 através dos serviços de iniciação de pagamento.

Pergunta: Como o open banking pode atingir o consumidor na ponta? Como se dará o escopo de operações de créditos da fase de implementação?

João entende que, figurativamente, o open banking vai ser o banco de cada um, então cada um pode decidir os serviços que poderá utilizar de acordo com a sua conveniência. Quanto ao escopo de operações de crédito na primeira fase de implementação, já que não haverá o processamento de dados sensíveis, não há necessidade de obtenção de consentimento. As instituições financeiras farão uma primeira análise sem necessidade de adaptar a cada caso, ou seja, a primeira fase consistirá em um “Buscapé” de crédito, sem ainda considerar as especificidades de cada tomador.

Pergunta: Como que fica a participação de instituições não autorizadas? Não cria uma barreira à entrada?

Há um processo vigente de regulação que vem facilitando e derrubando as barreiras. Então há toda uma adaptação para trazer ao mundo regulado de forma muito mais fácil, mais leve e com custo de observância de regulação proporcional ao risco. A primeira questão a ser analisada na implementação regulatória é a questão da segurança para evitar qualquer tipo de problema como vazamento de dados. Há possibilidades de entrada no sistema. O BCB está discutindo criar novas possibilidades de entrada no sistema para instituições não autorizadas participarem do processo.

Considerações Finais

Gabriel Araújo Souto e Luiza Leite sintetizaram os tópicos abordados durante o webinário. Ao final, agradeceram a participação dos convidados, da audiência e recomendaram os canais de comunicação do LAPIN e do Instituto ProPague para acessarem mais conteúdos sobre o tema.

Confira este relatório em PDF:

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