Relatório do Webinário “Caminhos para a Correta aplicação da Inteligência Artificial no Brasil”

Por Matheus Depieri

Clique aqui para assistir ao webinário na íntegra

Na ocasião do lançamento da cartilha Noções Gerais de Inteligência Artificial, o LAPIN realizou o webinário “Caminhos para a correta aplicação da inteligência artificial no Brasil”, que contou com a participação de Marcio Gonçalves, diretor de relações governamentais na Microsoft, Nina da Hora, criadora da Computação da Hora e do podcast Ogunhê e Edson Prestes, professor do Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O evento, moderado por Eduarda Costa, coordenadora da área de vigilância do LAPIN, teve como principal objetivo discutir temas essenciais sobre o desenvolvimento da Inteligência Artificial no contexto brasileiro.

Abaixo será apresentado um resumo das principais contribuições dos painelistas, separados de acordo com os blocos de discussão do evento. Para assistir ao webinário na íntegra, clique aqui.

Bloco 1: É possível comparar inteligência artificial com inteligência humana? 

Ao iniciar a discussão, Nina da Hora destacou que Inteligência Artificial não é um conceito fechado, na medida em que há grande discordância sobre a sua definição. Apesar das discordâncias, foi destacado que há, nos sistemas de IA, uma tentativa da simulação da inteligência humana, mas que não é possível afirmar de forma definitiva se um dia a IA vai alcançar ou ultrapassar a racionalidade humana. Edson Prestes, complementando o debate, comentou que o fato se de atribuir a um sistema computacional a expressão “inteligência artificial” não significa dizer que o sistema seja inteligente, uma vez a inteligência é um termo extremamente complexo e que pode abarcar, a depender da perspectiva cultural, questões relacionadas a relacionamentos interpessoais, pensamento rápido, reflexão, etc. Ele também destacou o fato de que algoritmos são muito “estreitos” em seu funcionamento, por serem focados na resolução de problemas específicos, ao passo que a inteligência humana costuma levar em consideração emoções, experiências, relacionamentos, entre outros fatores. Por fim, Márcio Golçalves destacou que, na visão da Microsoft, a IA tem como objetivo potencializar a engenhosidade humana e ajudar a desenvolver tarefas de forma mais eficiente, de forma que a inteligência humana jamais será totalmente substituída pela inteligência artificial.

Bloco 2: Impacto da IA no Brasil e no mundo

Márcio destacou que a IA é um caminho sem volta e que o potencial da tecnologia está apenas no começo de sua exploração. De acordo com Márcio, o Brasil está inserido no movimento global de aplicação de IA, uma vez que já há exemplos concretos dessa tecnologia sendo utilizada em diversos setores da economia. Apesar da crescente utilização de sistemas que se valem de inteligência artificial no país, Nina comentou que alguns problemas são atualmente vivenciados no Brasil, quais sejam: (i) a falta de informação em língua portuguesa sobre IA, especialmente de material em linguagem acessível pra sociedade no geral; e (ii) a ausência de uma discussão aprofundada sobre a questão ética da IA, haja vista a necessidade de debater as implicações da tecnologia através um envolvimento de diversas esferas da sociedade civil. Ao ser questionado sobre os principais desafios para o desenvolvimento de IA no Brasil, Edson disse que as dificuldades estão em diferentes níveis, desde a infraestrutura básica até colaboração internacional multilateral. Como exemplos práticos desse desafio, foram mencionados:  (i) a necessidade de acesso amplo à internet, não apenas para as pessoas se informarem, mas também para que todos os setores da sociedade possam fornecer dados para que elas sejam representadas no dataset utilizado no treinamento da IA; (ii) a necessidade de educação e capacitação, não apenas do ponto de vista técnico mas também nas áreas de humanidades, para que se possa refletir sobre o impacto da tecnologia e sobre questões éticas ou humanitárias; e (iii) o desenvolvimento de um arcabouço normativo para se criarem mecanismos claros de responsabilização, por exemplo.

Bloco 3: Como direcionar o desenvolvimento e uso de IA para atender direitos humanos e representatividade? 

Nina  destacou a importância da interdisciplinaridade no desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial, na medida em que a parte técnica da computação deve sempre ser complementada por uma análise ética-social proporcionada pelas ciências humanas. Edson, por sua vez, destacou a importância de se realizar um mapeamento dos instrumentos relacionados aos direitos humanos (normas nacionais e internacionais), uma vez que muitos profissionais da área e muitas empresas de tecnologia não têm total conhecimento do arcabouço normativo relacionado aos DHs. Ademais, também é importante a realização de uma revisão dos instrumentos tradicionais de direitos humanos no contexto digital, bem como o desenvolvimento de mecanismos para monitoramento de violações a direitos que eventualmente ocorra com o uso de IA. Márcio Gonçalves, por fim, comentou da importância de as empresas se prepararem para antecipar e responder a problemas que possam advir do uso de Inteligência Artificial, uma vez que há a possibilidade de a tecnologia ser utilizada de forma diferente da que foi originalmente idealizada. 

Bloco 4: Como pensar a IA no contexto brasileiro, sabendo que somos um país diverso, com muitas desigualdades e com desafios do ponto de vista de desenvolvimento tecnológico?

Márcio Gonçalves começou a discussão apontando que, apesar de termos diversos fatores que dificultam a adoção da tecnologia, há muita oportunidade de desenvolvimento no Brasil por meio do uso de IA. Como exemplo, foi citado um estudo que aponta que se o Brasil adotar um pouco de IA a economia crescerá 1,6 vez mais até 2030, e que se usar massivamente IA esse crescimento pode chegar a 2,4 vezes. Nina, por sua vez, comentou com otimismo a atenção do público sobre recentes incidentes da tecnologia, mencionando a atenção da população com vazamento de dados e o questionamento sobre o impacto na vida das pessoas, o que demonstra que os cidadãos estão querendo saber mais sobre os diversos aspectos da tecnologia. Sobre o uso de IA no contexto brasileiro, Nina destacou a problemática de se importar, de forma acrítica, ferramentas desenvolvidas no exterior sem que se analise com detalhes os impactos e o contexto social específico do Brasil. Apesar disso, foi mencionado um movimento de algumas empresas internacionais em fazer pesquisas direcionadas para o Brasil, o que pode demonstrar um uso mais responsável da IA. Outro ponto essencial destacado na fala da Nina foi a necessidade de se construir uma ponte entre empresa, universidade e governo, na medida em que se deve envolver essas três esferas para se obter resultados melhores e mais responsáveis com o desenvolvimento e uso de IA. 

Bloco 5: Quais são os caminhos regulatórios para o desenvolvimento responsável da IA?

Edson comentou a possibilidade de se trabalhar em dois caminhos: (i) por meio da criação de soft law e guidelines definindo de que maneira os softwares e produtos de IA tem que ser produzidos (com a criação de selos de qualidade, por exemplo, o próprio mercado exerceria pressão para que empresas sigam as melhores práticas); ou (ii) regulamentações em forma de leis, apesar de ter a problemática de que a demora na aprovação de legislações faz com que as normas não necessariamente acompanhem o avanço da tecnologia. Ainda sobre esse tema, Márcio Magalhães comentou a importância de se ter uma regulamentação mais principiológica, para se evitar que as leis fiquem obsoletas rapidamente.

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