Vigilância por lentes opacas

Cynthia Picolo
Pablo Nunes

Desde 2019, o Brasil tem testemunhado um aumento significativo no uso de dispositivos digitais de vigilância pelo Estado, especialmente câmeras de reconhecimento facial. Após duas eleições, o que se pode afirmar é que, embora essas câmeras tenham se tornado parte involuntária do cotidiano de milhões de brasileiros, seu funcionamento, os responsáveis por sua operação e os custos envolvidos em sua aquisição permanecem grandes interrogações. Essa falta de transparência não é apenas uma falha administrativa, mas uma ameaça direta aos direitos dos cidadãos, abrindo espaço para abusos de poder e erosão da confiança pública.

Este relatório lança um olhar crítico sobre os mecanismos de transparência pública no uso de câmeras de reconhecimento facial na segurança pública em todas as cinco regiões do Brasil. Fruto da colaboração entre o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) e o Laboratório de Políticas Públicas e Internet (Lapin), a pesquisa apresentada aqui mensura o grau de transparência ativa e passiva em 50 casos de uso de reconhecimento facial, propondo uma análise aprofundada de seu atual estado de opacidade. Os resultados são alarmantes: a maioria desses projetos opera sem atender aos padrões mínimos de transparência, o que deveria ser uma exigência básica em qualquer democracia.

Com este relatório, CESeC e Lapin procuram não apenas mapear as falhas de transparência, mas também contribuir para o debate sobre a necessidade de se banir o uso de reconhecimento facial em espaços públicos. Ao identificar elementos que tornam ainda mais preocupante o uso dessa tecnologia, esperamos fomentar uma reflexão crítica e responsável que leve à proteção dos direitos fundamentais das pessoas e à implementação de políticas públicas verdadeiramente justas, eficazes e transparentes.

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