Ontem, 27/05, teve início no Supremo Tribunal Federal o aguardado julgamento definitivo do mérito da ADPF 403 e da ADI 5.527, duas ações constitucionais ajuizadas em 2016, em face da desarrazoabilidade de decisões judiciais que determinavam o bloqueio do acesso ao WhatsApp. O LAPIN já teve a oportunidade de explicar os meandros da discussão de ambas as ações neste texto, mas aqui vai um breve resumo, caso você tenha perdido.
- Entre 2015 e 2016, ganharam repercussão no país algumas decisões judiciais que determinaram a suspensão do serviço de mensagens instantâneas do WhatsApp em função do descumprimento de ordens judiciais para a entrega de dados de usuários no âmbito de investigações criminais.
- Uma dessas decisões, emanada por um juiz de Lagarto (SE), inovou ao utilizar como fundamento uma interpretação problemática dos arts. 11, 12, 13 e 15 do Marco Civil da Internet (MCI), que tratam da guarda de registros de acesso por provedores de serviços online.
- Em resposta às medidas desproporcionais que determinaram o bloqueio dos aplicativos mais utilizados de comunicação instantânea, o Partido Popular Socialista (PPS) ajuizou a ADPF 403, enquanto o Partido da República (PR) ajuizou a ADI 5.527.
- Ao passo que a ADPF 403 restringia-se em apontar ofensa à liberdade de comunicação de milhares de brasileiros; a ADI 5.527 ousava / extrapolava ao indicar a inconstitucionalidade de dispositivos previstos no Marco Civil da Internet (art. 10, § 2º e art. 12, III e IV)
Em 2016, o LAPIN, em parceria com o Instituto Beta para Internet e Democracia (IBIDEM), foi admitido como amicus curiae na ADPF 403. Hoje, o ministro Edson Fachin, responsável pela relatoria da ADPF 403, citou a produção do LAPIN diversas vezes, a fim de embasar seu voto. Em suma, o ministro asseverou a importância da criptografia incorporada no sistema do WhatsApp para a manutenção do respeito ao direito à privacidade. Em seu voto, o relator também considerou como descabíveis as determinações vindas do poder judiciário em relação à suspensão de acesso ao serviço do WhatsApp com o suposto lastro legal do Marco Civil da Internet. Mesmo ainda não tendo sido estruturada, o ministro apontou a vindoura Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) como a instituição legal adequada para a determinação de medidas sancionatórias como as de suspensão do acesso a serviços providos na Internet.
O relator da ADPF citou os apontamentos do LAPIN ao mencionar que certas informações de acesso dos usuários, como os logs guardados pelos provedores, devem receber limitações temporais, além de estarem sujeitas ao controle dos próprios usuários (accountability). A decisão ainda menciona outros tipos de medidas de interceptação apresentadas pelo Laboratório, como a técnica do “man-in-the-middle”, em que se cria um terceiro para intervir na comunicação, passando-se por um dos dois interlocutores, e outras como o “Protocolo SS7“, que envolve a clonagem do aparelho, o “espelhamento do computador“, que requer o acesso físico ao aparelho, e a “captura de metadados”, que poderia ser feita sem a necessidade de quebra da criptografia.
Em suma, os votos da Min. Rosa Weber e do Min. Edson Fachin trouxeram avanços importantes ao reconhecer direitos digitais (como o direito à privacidade e à proteção de dados) como direitos fundamentais, além de resguardar o uso da criptografia em plataformas de comunicação, protegendo o sigilo das conversas dos usuários. Resta aguardar o voto dos demais ministros.
Confira os trechos citados:
Acesse o voto na íntegra: